"Nostalgia é negação: negação do presente doloroso... o nome para essa negação é 'ideal dos anos dourados' - a noção errônea que um período de tempo diferente é melhor do que o que se está vivendo - é uma falha na imaginação romântica daquelas pessoas que acham difícil lidar com o presente" ~ Woody Allen, Meia-Noite em Paris
Não sou do tipo que tem ilusões nostálgicas a respeito do passado, imaginando que tudo naquela época ou naquela outra era muito melhor. Adoro a tecnologia que me permite ter uma voz em formato de blog, as maravilhas da medicina atual, as descobertas que tanto deixaram nossa vida mais prática.
Da mesma forma, também não tenho ilusões a respeito da nossa era e sociedade, não confio no “espírito” que nos rege, no pós-(pós-)modernismo e, especialmente, não gosto do abandono de certos hábitos e gostos que não são absolutamente incompatíveis com a nossa vida hoje. Existem elementos das eras passadas que merecem ser resgatados.
Tomemos, por exemplo, o Período Regencial britânico, do qual eu nunca saberia não fosse a brilhante Jane Austen. Muitas das idéias e costumes que permeavam essa sociedade eram absurdos e ridículos e fico feliz que não existem mais. Por exemplo, naquela época, quem subia na vida pelos próprios esforços era ridicularizado, mas quem tinha tudo de mamata herdado do papai era considerado o máximo. Mesmo a Janezinha, Deus a perdoe, tinha esse ponto cego na vida dela de achar que gato que nasce no forno é biscoito.
Fora isso, as mulheres não tinham a menor chance na vida a não ser que agarrassem um marido rico; esnobismo e preconceito eram considerados qualidades bacanas e se você não seguisse exatamente e precisamente a gigantesca lista de regras de conduta social você seria colocado no total e absoluto ostracismo social. A não ser, é claro, que você fosse tão rico que ignorá-lo simplesmente não poderia ser uma opção para o resto da vizinhança.
Mas, por outro lado, existe algo tão agradável numa conduta apropriada, como a que era esperada na época.
Em nome da intimidade, espontaneidade e liberdade, nos tornamos grosseiros, desrespeitosos, invadimos o espaço e a liberdade alheia. Sinto, sim, nostalgia pelos tempos em que as mulheres eram tratadas como damas e os homens como cavalheiros. O valor demonstrado correspondente à dignidade humana. Aprendi com a Jane Austen que os bons costumes não eram falsidade e, sim, educação e respeito.
Sinto nostalgia pelos tempos das moças “prendadas”. Não quero que nossas avós sejam a última geração de mulheres que sabiam fazer trabalhos artesanais. Existe um valor no produto único, imperfeito e não-industrial. Gostaria de ter sido ensinada a bordar, costurar, fazer crochet e tudo mais. Hoje, quem faz isso é a exceção e não a regra.
Sinto nostalgia pelos tempos em que bom gosto e verdade eram termos absolutos. Sinto falta da valorização do que realmente é belo, artístico, poético, puro, digno, elevado, inspirador, emocionante e, de forma não-esnobística, de fato inteligente.
Sinto falta do tempo em que o contato pessoal era essencial não só para a felicidade, mas para a própria sobrevivência. Conversas, em vez de programas. Cartas e visitas, ao invés de posts no mural.
Horas investidas em livros, ao invés de videogame. Flores frescas, pinturas, papel de parede, vestidos longos, leques, renda, pianos, chapéus, cravate, charadas, bailes familiares, papéis de carta, caligrafia, côrte, caminhadas e picnics.
Jane Austen contribui com o mundo ao nos fazer enxergar que os valores e senso comum da nossa sociedade não são valores e senso comum absolutos. As verdades universalmente aceitas não são absolutamente universalmente aceitas. Será que algum dia enxergaremos a diferença entre o que é verdade e o que é simplesmente aceito?