Apaixonar pra quê?

As pessoas se apaixonam por todos os motivos. Porque ele é alto, moreno e tem olhos verdes. Porque toca violão e é afinado ao cantar. Porque todas as amigas iriam babar se o vissem. Porque tem uma postura meio principesca, como a gente sempre imaginou que teria quando ainda acreditávamos em contos de fada. Porque reserva os sorrisos para momentos especiais e, acrescentemos, que sorrisos! Porque a barba mal feita dá um ar de homem-homem pré-metrossexualismo, meio mal-compreendido meio bad boy a la Aragorn.  Porque mesmo assim, ele é um cavalheiro e seus pais iriam gostar dele. Porque gosta da mesma banda australiana semi-desconhecida que você. Porque resolveu dar, entre todas as pessoas, a você uma atenção especial. E depois de conquistar aos pouquinhos, ele se mantém distante apenas o suficiente para que você perceba que ele tem vida própria e não tem a menor pressa. Porque mesmo que ele não diga nada, você acha que detectou algo no olhar, um tom camuflado na voz, um gesto que teve mais que mil significados. Porque achou que viu lágrimas nos cantos de seus olhos enquanto assistia a um filme romântico. E — será que foi impressão? — ele olhou disfarçadamente para seu lado quando o mocinho do filme pediu a mão da mocinha em casamento.

Ou, às vezes, apaixonamo-nos por motivos que vão além dele próprio. Porque a lua cheia e a névoa fresca despertou borboletas adormecidas no estômago. Porque ele a protegeu numa situação de possível (mesmo que remoto) perigo. Porque a sua música desperadoramente romantica e nostálgica tocou bem naquele momento. Porque as estrelas parecem estar se movendo e desenhando o nome dos dois lá no céu. Porque por uma série de coincidências improváveis, vocês não param de se esbarrar pela cidade. Porque o seu meet cute é cinematográfico demais para se ignorar. Porque sua mãe pediu a ele que a tirasse de casa, pois estava tão sozinha. E ele não a achou patética mesmo depois disso.

Talvez você se apaixone por todos esses motivos e mais um pouco.

Mas o que a leva a permanecer?

Ele se tornou seu melhor amigo
Porque um dia você descobre o que o machuca e o que assusta. Você descobre o significado de cada sorriso e cada silêncio. Você percebe quais gestos têm significados e quais são só gestos. Você se encanta com um coração grande, um cheio de sonhos e idéias, um disposto a se deixar entregar e moldar todos os dias. Você descobre que ele tem falhas, tanto quanto você. Mas que ele tem tanta vontade de mudar e, ao contrário de você, de fato, muda. Porque você sabe com quem está e quase que exatamente o que ele está pensando. Porque ele se dispôs a compremeter-se a passar uma vida inteira amando-a, mesmo que mal-humorada, descabelada e gorda. Porque quando ele está com a cara amassada de sono, com o rosto espragatado contra o travesseiro, você enxerga nele o menininho que foi e o homem experiente que se tornará, tudo de uma vez só. Porque você conhece o toque dos lábios dele de cor e não consegue lembrar como era antes de o ter. Porque ele está disposto a servir e a ajudar, mesmo quando ele está tão ou até mais cansado e dolorido que você. Porque ele já conhece todas as suas crises e não se apavora com nenhuma delas. Porque ele sempre a lembra dos seus sonhos antigos e propósitos mais altos. E acredita em você, mesmo quando você não acredita. Porque ele quer ter seus filhos, mesmo quando parece tão óbvio que você seria uma péssima mãe. Porque ele se tornou seu melhor amigo, um que jamais imaginou ter. E nos olhos dele você enxerga você que enxerga ele que enxerga a você que enxerga a ele. E, no final de um dia, mesmo depois de brigas e estresses e problemas e dificuldades, é do lado dele que você deita, são os braços dele que passam ao redor do seu e, mais do que a proximidade física, você curte a intimidade emocional entre você e o homem que você escolheu, que a escolheu, que foram escolhidos por Deus e dormem sonhando com um futuro cheio de netos, cabelos brancos e rugas. Então você passa a mão pelos braços cheios de veias dele e desenha rios e vales com os dedos, ciente de cada centímetro da geografia desse homem. O coração dorme e desperta agradecido, emocionado e um pouco assustado por ter um tesouro tão maravilhoso nas mãos. E porque, ano após ano, talvez falha após falha e desafio após desafio, você não consegue suportar a idéia de vê-lo infeliz. Um homem como esse, mesmo imperfeito como você, mesmo com tanto a aprender, merece a vida, merece os sonhos, merece tudo. O esboço da alma dele está desenhado diante dos seus olhos e você o ama, simplesmente, sem motivo aparente, o ama.

E, de repente, você percebe que não faria diferença se ele fosse alto ou baixo. Olhos verdes ou pretos. Se toca algum instrumento ou detesta música. Se a lua é cheia ou nova. Se suas amigas pensassem que você está doida. Se está de barba ou não. Se vocês tivessem se conhecido de forma patética ou até mesmo só no dia que se casaram. O amor (de repente tão óbvio) não está numa música, num acaso ou em borboletas malcriadas dançando nas entranhas. O amor é uma cidade construída devagar, da base ao topo. Amo a nossa história. Cada momento passado junto, merecido ou imerecido, feliz ou miserável. Toda essa história fica escrita na nossa pele, nos nossos olhos, nas pontas dos dedos, como cicatrizes móveis, que respingam um no outro sempre que nos tocamos, nos falamos e experimentamos a vida juntos. E se o amor é uma cidade construída com a história, pode-se ter a certeza que a tendência é só crescer com o tempo. Pedra sobre pedra sobre pedra de lembranças e decisões e caminhos tomados.

E agora? Adoro arrancar seus sorrisos, ainda mais agora que consigo fazer isso. Sei identificar num olhar o significado de tudo o que se passa dentro dele e isso é exclusividade minha. Adoro suas lágrimas, segredos nossos, sua boca vulnerável. Eu nem recuo quando sua barba áspera arranha meu rosto, pelo simples prazer de estar próxima do seu. Suas mãos são mãos que já vi trabalhar pesado, criar e projetar, arrumar e, principalmente, fazer carinho. São as mãos de um homem de verdade, o homem que escolhi para passar uma vida. E mesmo escrevendo tudo isso, não lhe faço justiça. Não posso nem por um instante captar a essência do que o faz tão meu. Não há pessoa, lugar ou objeto que sequer se aproxime ao que o faz simplesmente quem é. É um tesouro tão indescritível e inalcançavel que me chegam as lágrimas. Meu amor, meu amor, quero você inteiro, inteiro num instante, num abraço, desaparecendo em mim. Quero guardá-lo para sempre. Quero massagear seus pés cansados e retribuir com gratidão para sempre o privilégio de ser sua.

Minha mais sincera sugestão às paixonites agudas, aos romances de verão e às amizades coloridas. Quando for oferecido é só dizer, "No, thankyouverymuch". Quem vai querer esse chiclete quando existe amor de verdade no universo?
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